A Hora

segunda-feira, março 14





O escuro lhe sufocava, olhava ao redor e não via nem um feixe de luz, nem mesmo pelas arestas da porta, cogitava estar de olhos fechados, mas sabia que seus olhos estavam arregalados de medo. Ouvira um barulho de passos, embora sonolenta, sabia que não era alucinação, era certo que tentava dormir havia algum tempo, mas não tinha ainda sequer cochilado.

Ouvira aquele barulho bem perto de sua cama, esperou, respirava rapidamente. Ouviu novamente os passos pesados, arrastados. Se sobressaltou, sentou encolhida na cama, o cobertor lhe envolvia, deixando apenas o rosto descoberto. Esperou novamente, aflita, fez se silêncio. Começou a ser atacada por um pânico urgente, o ar lhe faltava aos pulmões, podia ouvir a batida do próprio coração preencher o silêncio, suava muito e o cobertor pareceu lhe pano recém tirado da água quente, lhe fervia as faces. Sentia congelar unicamente as pontas dos dedos. Tremia, piscava agoniante sem enxergar nada, o ar estagnara, esquentava as narinas e tudo lhe parecia tomado por um calor infernal. Sentia empapar de suor as roupas que vestia, juntou as mãos no peito e pode notar que seu suor vertia fortemente. Conseguiu sentir escorrer
água ao apertar a camiseta.


Silêncio. Pensava de forma confusa, idéias se cruzavam, músicas idiotas em um momento inoportuno, ouvia sua mente repetir: Aleluia, aleluia, a musiquinha do fim do filme que vira dois dias antes. Deveria acender a luz? Ou gritar? Corria o risco de passar vergonha gritando feito criança e com medo de fantasmas, passou pela mente até culpar a sua conversão ao espiritismo, o medo absurdo que ganhara de fantasmas, mas calou.

Procurou lembrar se de uma reza para essas horas, mas nem o pai nosso recordava. A mente estava a um milhão, nada fazia muito sentido e só conseguia prestar atenção à frases soltas do tipo: A estrutura óssea do felino... Tremia, e pode ouvir sua avó brincar dizendo que ela tremia feito vara verde.

Sua avó? Sentiu fraquejar as pernas, passava quanto tempo retraindo os músculos em posição de feto? Não sabia. Mas passara metade da madrugada tomada pelo pânico, chegando quase a desmaiar por falta de ar.

Buscou coragem onde não tinha, colocou um pé fora no chão, apoiou as mãos na cama, uma poça molhava o colchão e o cobertor, preocupou se, desejava não ser urina, mas apenas o suor que minava exageradamente de seu corpo. Ficou em pé, um quente e denso fio de água percorreu lhe dos seios aos pés, sentindo empoçar nesses, sua face corou. Respirou fundo algumas vezes ainda até sair dessa posição enquanto aquele denso líquido exagerado lhe percorria o corpo.

No total escuro, tentou caminhar até o interruptor da luz, tropeçou em algo frio e grande, quase indo ao chão, caminhou tropeçando até conseguir alcançar algum móvel, teve de apoiar se nas portas do guarda roupas.

Ouviu um estrondo, como se sua janela houvesse sido arrombada, desesperou, chorava compulsivamente e não saiu do lugar. Tudo continua imerso na escuridão, sinal de que sua janela permanecia intacta. Outra poça molhada juntou se aos seus pés, não acreditava suar tanto, ouvira o som barulhento de janela de ferro arrombada, mas estava tudo em tão perfeita ordem, não acreditava estar louca.

Não sentia mais o ar, achou estar sofrendo de algum tipo de alucinação claustrofóbica. Apoiou melhor as mãos na parede ao lado do guarda roupas. Tentou alcançar o interruptor, sentiu o corpo adormecer, piorar a parca respiração.

Fechou os olhos e rezou de qualquer jeito, enquanto o vazio quebrava se por ruídos estranhos. Abriu os olhos, a luz ardia a retina, vinda por todos os lados, confusa, não se lembrava se teria acendido a luz. Pouco importava. Tudo lhe pareceu turvo, embaçado, levou as mãos ao rosto e percebeu que estava sem os óculos fundo de garrafa. Olhou ao redor, tentando identificar qualquer coisa, respirava com dificuldade, tateou o móvel ao lado, era praticamente cega.

Tropeçou novamente naquilo que estava entre o guarda roupas e a cama, mas dessa vez desabou ao chão, caiu de rosto na poça grossa de água. Estranhou. Olhou para o objeto em que tropeçara e sentiu um frio tomar lhe a espinha, seu estômago revirou. A palma de sua mão estava toda vermelha, grudando entre no chão e o estranho objeto, sentiu mais uma revirada no estômago e uma ânsia forte invadiu lhe a garganta, fazendo surgir um gosto de bílis com comida digerida.

Como num passe de mágica conseguiu ver perfeitamente, ali jogado no chão, jazia seu corpo inerte, era seu corpo, não sabia como explicar, mas sabia reconhecer seu corpo, desesperou se, olhou em volta, a janela escancarada, o quarto revirado, sua TV sumira, na cama uma faca enorme estava lambuzada de vermelho, seu sangue.

Aproximou o rosto de seu corpo, uma linha marcava o pescoço, por onde escorria um denso líquido vermelho escuro, havia também um furo, que deixava seu coração amostra, novamente tudo ficava nublado.

Olhou atordoada para os lados, para no fim pousar os olhos para o alto, onde um homem de roupas brancas olhava complacente para ela, sorriu um sorriso frio, estende lhe a mão, a luz inebriava sua visão.

Ela chorou, sabia, era chegada sua hora

Um Conto de Adrianna Alberti 
Site da Autora: http://drialberti.wordpress.com/








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Comentários 2 Comentários:

lucascardoso disse...

Vc e otimo d+ d+mesmo!!

22 de setembro de 2011 às 11:02
Anônimo disse...

Muito bom! Parabéns Adriana!

13 de fevereiro de 2012 às 20:36

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